Um leão por dia na profissão, e um dia de cada vez nos rallies

1

FOTO: SANDERSON PEREIRA

Há quase um ano, o executivo Leandro Torres trouxe para o Brasil o primeiro título do Dakar na categoria UTV (esse ano vai se chamar SxS – side by side). Para 2018, ele passa o bastão para a dupla Zeca Sawaya e Marcelo Haseyama, que representarão a Polaris.

Acordar antes do sol nascer não é a opção da maioria das pessoas. Ainda mais se o objetivo for praticar esportes. Mas para muitos executivos, essa é uma escolha de vida na qual eles se apoiam para conseguir manter o equilíbrio entre o estresse do trabalho e a saúde do corpo.

A explicação pode vir da meditação. Transtornos de ansiedade e estresse têm raízes na repetição de ideias e na dificuldade em esvaziar a mente, o que se consegue através de técnicas de respiração e mudança de foco. Sem a reflexão espiritual, claro, o exercício concentrado é capaz de causar o mesmo efeito.

Durante a prática de um esporte, principalmente os mais radicais, a concentração é fundamental. “Pode ser a diferença entre a vida e a morte”, conta o diretor do BTG Pactual e piloto oficial Polaris, Leandro Torres. “Se a mente não estiver focada na pista, no carro e na antecipação de qualquer problema, o acidente pode ser feio em alta velocidade”, completa.

Mesa de trabalho em um dia normal

2

FOTO: SANDERSON PEREIRA

Oficialmente, Leandro tem um cargo estressante. Passa horas com pelo menos quatro telas de televisão abertas, atento a qualquer mudança que possa afetar o mercado, desde a criação de uma nova empresa na China até a queda de um ministro no Brasil. A vida profissional dele é movida a estratégia. E essa, com certeza, foi a ferramenta mais importante para se consagrar o primeiro brasileiro campeão do Rally Dakar em um UTV em janeiro deste ano.

“Minha rotina profissional é muito parecida com o que passo nos rallies. É preciso ter sangue frio e manter o foco. Lido diariamente com grandes perdas e ganhos e isso não pode me afetar. No primeiro ano que participei do Dakar, precisei conhecer as inúmeras variáveis. Capotei na terceira curva do prólogo. A partir daí, soube que teria que manter a ansiedade baixa para ter sucesso. Este ano, com mais maturidade no esporte, consegui manter o equilíbrio e pensar que uma prova de longa duração não se ganha no primeiro dia, é preciso muito planejamento”, explica.

Dakar 2017

Chegar ao ponto de se tornar um piloto profissional com o Polaris RZR 1000 não foi fácil. Em 2005, Leandro Torres pesava 135 quilos, teve um problema sério relacionado ao estresse e foi internado para uma cirurgia bariátrica emergencial. Passou 60 dias na UTI com uma infecção bacteriana gravíssima e se salvou. “Todos os dias que estive na UTI tinha a certeza que ia vencer. Quando sai de lá, minha vida recomeçou. Comecei uma rotina de exercícios e ela me levou as corridas”.

Com 46 anos, ele está no auge da carreira profissional, tanto no mercado financeiro quanto na direção do seu Polaris. Quando sai do escritório, ele diz que desliga um botão e liga outro. “A principal busca é pelo autoconhecimento. Hoje, consigo controlar a dor e o cansaço. Eles estão lá, mas eu nem me lembro. Ou porque a bolsa está caindo ou porque meu pé está queimado e eu preciso terminar a especial para continuar na prova. No Dakar, tenho que pensar num pneu furado enquanto a temperatura passa de 35 para -5 graus. É um leão por dia, igual no trabalho”.

Versão 2018

A nova dupla Polaris Zeca Sawaya e Marcelo Haseyama já está em concentração para a edição 2018 do Rally mais difícil do mundo. E eles têm rotinas bem parecidas com a do Leandro Torres. Coincidência?

O piloto Zeca Sawaya

Zeca tem uma construtora e viaja o tempo todo acompanhando obras. “Preciso dessa válvula de escape. E numa vida tão agitada, ainda tenho que arranjar tempo para me preparar para cada prova de rali. Mas essa é a melhor parte”, diverte-se.

O navegador Marcelo Haseyama

“As pessoas se perguntam como conseguimos recuperar energia gastando mais ainda… é pelo próprio desafio das atividades. Ficamos viciados na adrenalina do trabalho. O rali é um intensivo da vida profissional. Você tem desafio, pressão, concorrentes, tomadas de decisão. Tem que saber o seu limite”, conta Marcelo, que é engenheiro eletrônico.

A 40ª edição do Dakar já começou. A primeira etapa aconteceu no dia 6 de janeiro, em Lima, no Peru. A rota segue para a Bolívia e Argentina, finalizando no dia 20 em Córdoba, com quase 9.000 quilômetros a serem percorridos 332 veículos inscritos.

Torres Racing mantém liderança da categoria no Rally dos Sertões

202_rs17_gustavoepifanio_040086

FOTO: DIVULGAÇÃO

Um dia após melhorar sua posição na classificação geral do UTV, a Torres Racing encontrou dificuldades para manter a ascensão no Rally dos Sertões 2017. O piloto Leandro Torres e o navegador Lourival Roldan não conseguiram rodar no mesmo ritmo dos líderes da prova, na casa de 2 horas, e completaram a etapa desta quarta-feira (23), entre Aruanã (GO) e Barra do Garças (MT), com a 31ª melhor marca, em 3h12min27s83.

O resultado, no entanto, não comprometeu a liderança na categoria UTV Pro Aspirado, com o tempo acumulado de 17h53min15s39. No geral, a dupla passou do 14º para o 18º lugar.

A etapa desta quinta-feira (23), entre Barra do Garças e Coxim (MT), será a mais longa da edição de 25 anos do Rally dos Sertões, com 438,86 quilômetros de Especial (trecho cronometrado) e 666,01 km de deslocamento total, e grande variação de terreno, com trechos de serra, trial e longas retas em áreas agrícolas.

“É uma competição, e um dos objetivos sempre é conseguir uma boa colocação. Mas, nem por isso deixaremos de adotar cautela quando achar necessário. Estamos satisfeitos e seguiremos na mesma toada até a linha de chegada”, disse Torres.

Este slideshow necessita de JavaScript.

Rally dos Sertões 2017 – Categoria UTV Pro Aspirado – acumulado:

1º – Leandro Torres/Lourival Roldan

2º – Higor Gontijo/George Torres

3º – Carlos Ambrósio/Cadu Sachs

Rally dos Sertões 2017 – UTV após quatro etapas – acumulado:

1º – Lucas Barroso/Breno Rezende

2º – Bruno Varela/João Arena

3º – Henrique Gutierrez/André Lucas Munhoz

18º – Leandro Torres/Lourival Roldan

Não basta ser pai, tem que acreditar: como os filhos ajudaram Leandro Torres, campeão do Dakar, a vencer uma batalha de 60 dias no hospital

1

Foto: Marcelo Machado/Vipcomm

Engana-se quem pensa que o maior desafio encarado por Leandro Torres foi superar mais de 8.000 quilômetros de percurso para vencer o Rally Dakar em 2017. Para se tornar, ao lado de Lourival Roldan, o primeiro brasileiro a ser campeão da maior e mais temida prova off-road do mundo, o piloto precisou antes vencer o rali da vida.

Em 2005, Torres pesava 130 quilos. Com dois filhos pequenos em casa, não tinha pique para acompanhá-los e, aconselhado por médicos, fez uma cirurgia bariátrica. Mas, durante a recuperação, ele pegou uma infecção na parte alta do estômago (fístula) e ficou 60 dias internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

Pai de Thiago e Diogo, atualmente com 15 e 13 anos, respectivamente, Torres havia acabado de descobrir que a Amanda, hoje com 11, estava a caminho. Luciana, a esposa, chegou a sofrer um sangramento durante o período de internação do marido. Estar saudável para ficar ao lado da família foi o maior incentivo que Leandro se apegou no leito do hospital para combater a infecção e sobreviver.

“A morte estava presente e você sentia que, se vacilasse, ela chegaria muito rápido. Mas, eu tinha fé de que sairia daquela situação. Eu já tinha dois filhos em casa e ia chegar minha filha. Eu precisava estar inteiro. Minha família foi uma grande motivação”, relembra o piloto de 45 anos. “Eu tinha de estar bem de cabeça para curar a infecção. Uma luta longa, de 60 dias, minha mulher grávida. Foi um momento bem difícil. Durante a minha estadia no hospital, prometi que, se eu vencesse essa batalha, iria fazer tudo o que tivesse vontade e que Deus permitisse”, completa.

Promessa é dívida. Com o apoio da família, Torres encontrou no rali uma maneira de usufruir ao máximo a nova oportunidade que a vida lhe proporcionou. Iniciou entre as motos, em 2007, migrou para os carros e, desde 2014, apaixonou-se pelo UTV, categoria na qual sagrou-se campeão geral do Dakar deste ano.

Mais uma vez, a força vinda do lar o impulsionou para mais uma grande conquista. “Quando venci o Dakar, fiquei emocionado ao abraçar o Lourival, meu parceiro naquela jornada, mas quando abracei minha família. Eles sofreram tanto quanto eu”, afirma.

E a paixão pelas trilhas, ao que tudo indica, pegou mais um integrante dos Torres. Thiago, o filho mais velho de Leandro, começou a correr de UTV em 2016 e tem acompanhado o pai nas competições. No início de julho, o adolescente ficou em sétimo lugar na geral e foi o primeiro em sua categoria, a Infantil, no Rally Rotas SC, na serra catarinense.

Ainda em comemoração ao Dia dos Pais, Leandro Torres estará na reta final de preparação para a edição de 25 anos do Rally dos Sertões, entre 19 e 26 deste mês, com largada em Goiânia (GO) e chegada em Bonito (MS). Ele e Roldan terão uma equipe própria, a Torres Racing, e são favoritos ao título entre os UTVs, mas o piloto não abre mão do clima familiar da principal prova off-road do Brasil.

“Óbvio que é uma competição, mas quero me divertir, ter prazer. Esse é o grande motivo do rali. Se vier uma boa colocação, melhor ainda. Nessa toada, a gente conseguiu atingir objetivos bem difíceis. O Rally dos Sertões tem essa fórmula a mais que o Dakar, que é conviver socialmente com seus amigos em uma competição. Isso engrandece a prova por si só”.